Thursday, December 27, 2012

1973 - Flávio Cavalcanti Suspenso

Jornal do Brasil


Data de Publicação: 16/3/1973

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CENSURA SUSPENDE POR DOIS MESES FLÁVIO E O PROGRAMA



Brasília (Sucursal) - O Programa Flávio Cavalcanti, da TV Tupi, foi retirado ontem do ar por 60 dias, através de portaria do diretor da Divisão de Censura e Diversões Públicas do Departamento de Polícia Federal, Sr. Rogério Nunes, que pune com suspensão, pelo mesmo prazo, o apresentador Flávio Cavalcanti e o produtor Wilton Franco.



Em conseqüência do problema criado, que teria atingido a própria esfera da Presidência da República, os programas ao vivo deverão ser proibidos, pois a simples aprovação do script não impede a repetição de quadros ofensivos à moral e à dignidade humana.



TV NACIONAL - Na manhã de ontem, os Ministros Higino Corsetti e Alfredo Buzaid, das Comunicações e da Justiça, reuniram-se a portas fechadas no Ministério das Comunicações, para a análise geral do problema da televisão brasileira.



Posteriormente, em carros separados, seguiram para a TV Rádio Nacional de Brasília, onde chegaram às 10 horas, sendo recebidos pelo diretor da empresa, Sr. Cavalcanti de Melo. Essa foi a primeira vez que o Governo usou a TV Nacional de Brasília para assistir vídeo-tape.



Os dois Ministros assistiram à gravação juntamente com vários parlamentos, entre os quais os líderes Geraldo Freire (Arena) e Aldo Fagundes (MDB), os Deputados Cantidio Sampaio, Sílvio Furtado, Jorge Ferraz, Lomanto Júnior e Daniel Faraco, entre outros.



O Ministro Alfredo Buzaid, que estava ao lado do General Nilo Canepa, mostrou-se profundamente irritado com a participação de um delegado mineiro no programa. O Ministro Higino Corsetti chamou a atenção sobre outro problema: não é obedecida de modo algum à legislação sobre o tempo de propaganda comercial. Entre os que assistiram à gravação, poucos tinham visto o programa anteriormente e o comentário geral era de que nunca a televisão desceu tão baixo.



REUNIÃO - Os dois Ministros deixaram a TV Nacional às 11h15m, tendo o professor Buzaid convocado o General Canepa para uma reunião em seu Gabinete. O General Canepa voltou a estar com o Ministro Buzaid na parte da tarde, debatendo-se a legislação sobre censura, pois havia várias hipóteses para enquadrar o apresentador Flávio Cavalcanti e o produtor Wilton Franco.



Desde o entendimento que o Ministro Alfredo Buzaid manteve na Guanabara, anteontem, com a direção da TV Tupi, estava acertada que não haveria punição para a emissora, pois esta desconhecia o script do programa. A ação do Ministro Buzaid foi iniciada praticamente na segunda-feira, pois a repercussão negativa alcançara, segundo alguns, a própria esfera da Presidência da República.



INTERROMPIDA - O diretor da Divisão de Censura e Diversões Públicas do DPF, Sr. Rogério Nunes, que se encontrava em férias, foi convocado extraordinariamente ontem pelo General Nilo Canepa, a fim de que fosse feito um estudo em conjunto sobre as providências a serem tomadas.



Na realidade, o Sr. Flávio Cavalcanti comunicou à Censura que levaria ao seu programa os personagens do caso do marido que emprestou sua mulher a um amigo. A Censura teria deixado passar o quadro e as perguntas, baseada em relatório da polícia mineira. Isso serviu para a Polícia Federal, onde se reconhece que é muito difícil exercer a censura prévia sobre um programa ao vivo, quando se tem em mãos somente as perguntas e não as respostas.



NÃO VOLTARÁ - No julgamento da penalidade a ser imposta ao Sr. Flávio Cavalcanti, influi consideravelmente o baixo nível dos programas que apresentou anteriormente. Em outras ocasiões, o próprio Ministro Alfredo Buzaid já tinha adotado providências para que o animador fosse advertido a respeito. O Sr. Flávio Cavalcanti já estava sendo observado pelas autoridades, pois em diversos quadros infringira vários artigos do Decreto 51 134.



Apesar de não haver nenhum comentário oficial a respeito, informava-se ontem que a volta do Sr. Flávio Cavalcanti às câmeras de televisão após a sua suspensão era considerada muito pouco provável. Isso seria uma atitude contrária aos princípios que devem nortear a programação de televisão, segundo pensamento de algumas autoridades.



UNANIMIDADE - Os deputados que viram a gravação do programa foram unânimes em condenar a exploração da ignorância e da miséria de gente humilde, como ficou evidenciado no quadro do marido que emprestou a mulher ao amigo. O líder do MDB, Sr. Aldo Fagundes, advertiu, no entanto, que embora alguma coisa precise ser feita pelas autoridades, não é indispensável recorrer "à força", pois o Governo dispõe do "instrumento legal necessário."



Na Câmara, o Deputado Padre Nobre reclamou medidas drásticas do Governo. Observou que "a Censura Federal, que se exerce tão drasticamente sobre fatos e assuntos políticos, não representa a mesma realidade quando em outras matérias que afetam a dignidade da nação."



Vários outros deputados condenaram também o programa. Um deles, o Sr. Cid Furtado (Arena-RS), disse que "o Sr. Flávio Cavalcanti está passando dos limites ao achincalhar a dignidade da pessoa humana, ferindo a consciência cristã do nosso povo."



A PORTARIA - É a seguinte, na íntegra, a Portaria 5/73 da Censura Federal, assinada pelo diretor Rogério Nunes:



"O diretor da Divisão de Censura e Diversões Públicas do DPF, no uso de suas atribuições legais e considerando:



1) Que o quadro intitulado "Flávio Confidencial", do "Programa Flávio Cavalcanti", transmitido no dia 11 do corrente mês pela Rede Tupi de Televisão, canal o6, da Guanabara, tratou de assunto contrário à moral e aos bons costumes, explorando de forma altamente negativa um fato infeliz, com grave desrespeito à família brasileira; e 2) que o "Programa Flávio Cavalcanti". em apresentações anteriores, por mais de uma vez, violou o disposto do Artigo 29, item I, do Decreto n° 51 134, de 03 de agosto de 1961, tendo sido advertido por essas reincidências.



Resolve:



I) Suspender de suas atividades artísticas, em todo território nacional, pelo prazo de 60 dias, contando a partir desta data, por infringência ao Artigo 2º, item I, do Decreto n° 51 134, de 3 de agosto de 1961, o diretor do referido programa, radialista Wilton Franco, e respectivo apresentador, Sr. Flávio Cavalcanti, de conformidade com o disposto no Artigo 117 do Decreto n° 20 493, de 24 de janeiro de 1946;



II) aplicar ao "Programa Flávio Cavalcanti" a pena de suspensão por 60 dias, a partir desta data, de acordo com o Artigo 117 do Decreto n° 20 493, de 24 de janeiro de 1946."



Presença de delegado é condenada em Minas - Belo Horizonte (Sucursal) - O Deputado Silo Costa (Arena) afirmou ontem na Assembléia Legislativa de Minas que absolutamente não aceita "a agressão ao povo brasileiro cometida domingo pelo animador de televisão Flávio Cavalcanti, que procurou diminuir ou menosprezar principalmente a família mineira."



Afirmou também que não aceita que o Secretário de Segurança de Minas "tenha autorizado o delegado a comparecer ao programa porque o considero um equilibrado. Mas é preciso notar que se Sua Excelência deu essa autorização, também ele é inexperiente e a Secretaria de Segurança do nosso Estado não pode ficar entregue a um homem inexperiente."



GRITO NACIONAL - O Sr. Silo Costa, depois de lembrar que jornais mineiros reagiram à altura, com entrevistas de autoridades focalizando o assunto, declarou que se sentia de certa forma reconfortado ao ver que jornais cariocas e paulistas - que trataram o assunto com o devido comedimento - também reagiram contra o animador, divulgando protestos da Câmara Federal e do povo de todos os Estados.



"A verdade é que há um grito nacional tem que haver porque o nível dos programas de televisão tem de melhorar."



PAÍS TEM O MAIOR NÚMERO DE APARELHOS - Santiago do Chile (AP-JB) - O Brasil tinha, no final da década de 1960, mais receptores de televisão do que todos os países latino-americanos, mas era superado pelo México e pela Argentina em número de estações transmissoras.



Segundo números divulgados ontem pela Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina (Cepal), o Brasil tinha 6,5 milhões de receptores em 1970 e apenas 50 estações. Na mesma ocasião, havia nos Estados Unidos 84,6 milhões de receptores e 2 703 emissoras.



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